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Quando investigar hipercolesterolemia familiar?

dislipidemia
Escrito por Luciano Albuquerque

A hipercolesterolemia familiar (HF) é doença grave responsável por 5-10% dos casos de eventos cardiovasculares em pessoas abaixo de 50 anos. O risco de um portador de HF na forma heterozigótica não tratado de desenvolver doença aterosclerótica coronária (DAC) ou morrer chega a 50% nos homens e 12% das mulheres aos 50 anos de idade. Estima-se que, no mundo todo, existam mais de 10.000.000 de indivíduos portadores dessa condição; no entanto, menos de 10% destes são diagnosticados e menos de 25% recebem tratamento adequado. Diante da suspeita clínica, fica indicada a triagem dos familiares, visto que cerca de 50% destes podem ser afetados. O diagnostico precoce e a intervenção adequada podem mudar a história natural dessa grave enfermidade.

A Hipercolesterolemia Familiar é caracterizada laboratorialmente por níveis muito elevados de colesterol LDL (LDLc). A suspeita clínica deve ser considerada diante de níveis de LDLc ≥ 190 mg/dl. Achados clínicos como xantomas tendinosos, xantelasmas. A HF é uma doença genética com padrão de herança autossômico Codominante, assim, a história familiar de DAC precoce e de níveis elevados de LDLc é invariavelmente presente. A grande preocupação é a alta incidência de doença aterosclerótica prematura (< 55 anos em homens e < 60 anos em mulheres) com significativa redução na expectativa de vida em muitas famílias.

O tratamento precoce com fármacos hipolipemiantes, especialmente de estatinas, reduz em até 80% o risco de DAC na HF. Estudos apontam que indivíduos acima de 55 anos com HF que receberam tratamento hipolipemiante ao longo de suas vidas tiveram taxas de infarto do miocárdio comparáveis à população geral, sem aumento de mortalidade por causa não cardiovascular. Sendo assim, a identificação de indivíduos portadores de HF e de seus familiares, com início precoce de terapia hipolipemiante, torna-se fundamental.

A atual Diretriz Brasileira de Hipercolesterolemia Familiar indica que todas as pessoas acima dos 10 anos de idade devem ser submetidas a análise do perfil lipídico. A avaliaçao deve ser considerarda a partir dos 2 anos de idade quando houver história familiar de DAC precoce ou se a própria criança apresentar xantomas, arco corneano ou fatores de risco (hipertensão arterial, diabete melito, fumo, obesidade) ou doença aterosclerótica. Se o perfil lipídico for normal, mas existirem outros critérios de possível HF, como história familiar de DAC precoce ou hipercolesterolemia significativa, o exame pode ser repetido após um ano. Na ausência desses fatores, o exame pode ser repetido em até cinco anos. Antes de se fazer o diagnóstico de HF, devem ser afastadas causas secundárias como hipotireoidismo e síndrome nefrótica. Deve também ser ressaltado que a presença de hipertrigliceridemia não exclui o diagnóstico de HF.

A Diretriz recomenda que o diagnóstico seja baseado no somatório dos achados clínicos e laboratoriais, associados a história familiar compatível, podendo ser confirmado pelo teste genético. A mutação mais comum é a do gene do receptor de LDL (85-90% dos casos), podendo ainda ocorrer mutações na ApoB (5-10%) e no PCSK9 (< 5%). Mais raramente, pode ocorrer uma forma de herança recessiva atribuída a expressão reduzida da proteína adaptadora do receptor de LDL tipo 1 (LDLRAP1). Para uma maior uniformidade nos critérios, a diretriz recomenda o uso da Dutch Lipid Clinic Network (Dutch MEDPED, ver tab. 1). Com base nesses critérios, o teste genético deve ser realizado nos casos classificados como “provável” ou “certeza”. Para os casos “possíveis”a indicação de teste genético deve ser individualizada.

Parâmetro Pontos
História familiar

Parente de 1º grau portador de doença vascular/coronária prematura (homem < 55 anos, mulher < 60 anos) OU

Parente adulto de 1º ou 2º grau com colesterol total > 290 mg/dL*

 

1

Parente de 1º grau portador de xantoma tendinoso e/ou arco corneano OU

Parente de 1º grau <16 anos com colesterol total > 260 mg/dL*

2
História clínica

Paciente portador de doença arterial coronária prematura

 

2

Paciente portador de doença arterial cerebral ou periférica prematura 1
Exame físico

Xantoma tendinoso

Arco corneano < 45 anos

 

6

4

Nível de LDL-c (mg/dL)

≥ 330 mg/dL

250 – 329 mg/dL

190 – 249 mg/dL

155 – 189 mg/dL

 

8

5

3

1

Análise do DNA

Presença de mutação funcional do gene do

receptor de LDL, da apoB100 ou da PCSK9*

 

8

Diagnóstico de HF:

certeza se

provável se

possível se

 

> 8 pontos

6 – 8 pontos

3 – 5 pontos

O rastreamento em cascata envolve a determinação do perfil lipídico em todos os parentes de primeiro grau (pai, mãe e irmãos) dos pacientes diagnosticados como portadores de HF. As chances de identificação de outros portadores de HF a partir de um caso-índice são: 50% nos familiares de primeiro grau, 25% nos de segundo grau e 12,5% nos de terceiro grau. O teste genético do caso-índice facilita o rastreamento em cascata, já que o teste dos parentes pode ser limitado à mutação já encontrada, reduzindo o custo do exame.



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Sobre o autor

Luciano Albuquerque

Preceptor da residência em Endocrinologia do HC-UFPE e da residência em Clínica Média do Hospital Otávio de Freitas. Presidente da SBEM regional Pernambuco no biênio 2019-2020.

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